A Atuação dos Estados na negociação do Tratado

A Atuação dos Estados na negociação do Tratado de Direitos Humanos e Empresas

Texto por: Janyne Gomes

Nos posts anteriores, falamos um pouco sobre o processo de criação do Tratado de Direitos Humanos e Empresas, assim como o poder das empresas transnacionais e sua influência nos Princípios Orientadores e Normas. Hoje, a série da semana vai falar um pouco sobre a atuação dos Estados na negociação do Tratado – qual a atuação dos países nas reuniões que discutem a implementação do mesmo.

Como vimos anteriormente, as empresas transnacionais, principalmente a partir do processo de globalização, começaram a se tornar entidades mais fortes que os Estados, gradualmente ocupando seu espaço nas negociações relacionadas ao Direito Internacional e permitindo um grau de controle e influência sobre os países, relativizando a soberania do Estado. Nesse sentido, os Princípios Orientadores de Ruggie, com características voluntaristas que não dão nenhuma obrigação vinculante às grandes empresas, trouxeram poucos avanços na proteção internacional dos Direitos Humanos.

Para entendermos a atuação dos Estados, precisamos primeiro entender o papel que ocupam na negociação do mesmo: apesar das grandes empresas estarem cada vez se tornando mais influentes nas negociações, ainda são os países que conduzem o processo pelo Direito Internacional, nada se faz sem a aprovação dos Estados.

O Estado que teve mais destaque no início das discussões sobre do Tratado foi o Equador. O país foi o articulador, com outros países do Sul Global, a discussão sobre a insuficiência dos Princípios Orientadores e necessidade de instrumento internacional juridicamente vinculante sobre direitos humanos no Conselho de Direitos Humanos do Equador em 2013, o que culminou na “Call for an international legally binding instrument on human rights, transnational corporations and other business enterprises” (em tradução livre: Solicitação de um instrumento internacional juridicamente vinculativo sobre direitos humanos, corporações transnacionais e outras empresas comerciais).  A partir dessa chamada, o Equador se tornou o país responsável pela criação e modificação dos rascunhos que vem sido discutidos nas sessões sobre o Tratado.

Os países que possuem mais opiniões contrárias ao Tratado tendem a ser aqueles que são sedes das grandes transnacionais. Os Estados Unidos, a Rússia e o Reino Unido, por exemplo, não poderiam ser “seduzidos” pela ideia de um Tratado, já que suas grandes empresas ficariam sujeitas às normas vinculantes do mesmo. Os Estados Unidos nem da discussão do Tratado participam mais, deixando claro que não ratificarão o mesmo. No entanto, mesmo sem aprovação desses Estados, a criação do Tratado ainda pode ser significativa no âmbito dos países em desenvolvimento, onde grande parte dessas transnacionais operam por meio de filiais. Ou seja, com a criação das normas vinculantes, as grandes empresas seriam obrigadas a cumprir as regras nos países que assinaram o Tratado.

Outro fator determinante para entender a atuação dos Estados nessa negociação é entender que o contexto interno e a política do país determina como vai ser sua atuação na esfera internacional. Foi esse segundo fator que fez com que o Equador perdesse um pouco do destaque na discussão que é líder, já que a política do país sofreu várias mudanças internas nos últimos anos. Outro exemplo claro dessa situação é o Brasil, que, apesar de ter sido um país com uma diplomacia reconhecida internacionalmente em defesa dos Direitos Humanos, com a ascensão da direita no país e o Governo de Jair Bolsonaro acabou retrocedendo perceptivelmente na abertura que dava a novas propostas em diversas discussões internacionais, incluindo na negociação do Tratado.

O Tratado precisa ser capaz de atrair um número significativo de Estados e uma redação e conteúdo que de fato priorizem a defesa dos Direitos Humanos em detrimento da lógica empresarial adotada até então para que sua implementação faça uma diferença real na prática. É por isso que todas as sessões e discussões se tornam necessárias no seu âmbito de negociação, para que se consiga pressionar o maior número de Estados adotarem uma postura e votarem em um texto que atenda às demandas das populações que são atingidas pelas violações das empresas. Além disso, as sessões também tem contado com a participação da Sociedade Civil (ONG’s, organizações como a Campanha Global “Stop corporate impunity”, entre outras), o que é um fator incomum e de grande avanço na esfera internacional, apesar do diálogo com a comunidade pouco influenciar na determinação de medidas para o Tratado. Vamos falar mais sobre a participação da Sociedade Civil e o que ela defende para o Tratado no próximo post!

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