10ª SESSÃO DE NEGOCIAÇÃO DO TRATADO SOBRE EMPRESAS E DIREITOS HUMANOS

Uma perspectiva geral do Homa sobre as discussões

Entre os dias 16 e 20 de dezembro de 2024 ocorreu a 10ª sessão de negociação do Grupo de Trabalho Intergovernamental Aberto sobre Corporações Transnacionais e outros Empreendimentos Comerciais com relação aos Direitos Humanos (OEIGWG) no âmbito do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra. O Homa, que participa das negociações desde seu princípio, após aprovação da Resolução 26/9 (A/HRC/RES/26/9) em 2014, neste ano representou a Justiça Global em suas falas e posicionamentos. Todos estes foram baseados em um documento de análise que comparou o rascunho do instrumento vinculante em discussão e o PL 572/22, que cria a lei marco nacional sobre Direitos Humanos e Empresas e estabelece diretrizes para a promoção de políticas públicas no tema, já disponibilizado em nosso site. Nesse post, iremos destacar os principais pontos discutidos na sessão, além de realizar um panorama da posição adotada pelo Brasil. 

Primeiramente, é importante ressaltar que as sessões ocorrem no mês de outubro desde a segunda sessão de negociação. No entanto, surpreendentemente, a Presidência do grupo, representada pela delegação do Equador, comunicou sua postergação há menos de um mês para as datas oficiais. A mudança repentina fez com que organizações e delegações não situadas em Genebra tivessem que se reorganizar, pois já haviam se programado e investido recursos para estarem presentes em outubro, sem a possibilidade de reembolso ou financiamento adicional para uma nova viagem, razão pela qual inviabilizou em grande medida a participação da sociedade civil, especialmente àquelas do Sul Global. A proximidade com o final do ano também implicou em custos significativamente mais altos, tornando a participação ainda mais inviável. Essa mudança não só desconsidera as limitações financeiras e logísticas das organizações da sociedade civil, como também restringe o espaço de diálogo e a pluralidade de vozes essenciais para garantir a legitimidade e a efetividade do tratado.

Desse modo, a decisão de trocar a Sala do Conselho de Direitos Humanos e da Aliança das Civilizações, espaço historicamente simbólico para o processo, evidenciou uma redução no número de participantes. Ainda que houvesse um número considerável de delegações estatais engajadas e participantes, a perspectiva crítica da sociedade civil foi comprometida pela falta de presença no espaço.

Apesar da diminuição do quórum, a negociação se mostrou produtiva e foi possível avançar até o Artigo 11. Entre os principais focos de discussão, que iremos adentrar e fundamentar em um documento futuro, destacamos: 

a) A importância da previsão do direito ao meio ambiente limpo, saudável e sustentável como um direito humano, conforme reconhecido pela Resolução 76/300 (A/RES/76/300) aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas. O questionamento e resistência quanto à previsão do direito ao meio ambiente foi feito em peso pela delegação dos Estados Unidos e por atores não governamentais norte americanos como o ‘United States Council for International Business’, algo que tende a se fortalecer com a chegada de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos e a recém saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris; 

b) Uso de ‘abuso’ ou ‘violação’ para se referir ao ato lesivo à dignidade humana cometido tanto por Estado como corporações, tendo em vista a fala feita pelo grupo de experts e a falta de convergência entre eles sobre o tema;

c) A problemática de condicionar a aplicação do Tratado à legislação doméstica, a interpretação equivocada do Artigo 27 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados e, por conseguinte, a resistência de se prever obrigações diretas e específicas às empresas transnacionais por violações cometidas em matéria de Direitos Humanos;

d) O conflito de interesse dos experts nomeados, pois não houve transparência quanto aos critérios de seleção ou firma de qualquer termo de compromisso, o que levantou questionamentos sobre sua atuação e metodologia de trabalho por parte de delegações dos Estados e sociedade civil;

e) A captura corporativa do espaço de negociação pela presença de representantes das empresas, o que foi questionado pela sociedade civil ao final das negociações. 

Em relação ao posicionamento da delegação brasileira, podemos perceber que há um avanço quanto ao reconhecimento da linguagem adequada, uso de ‘violação’ para se referir ao ato lesivo à dignidade humana e ‘obrigação’ quando se trata da proteção de direitos humanos. Além disso, o Brasil reviu seus posicionamentos e passou a aderir a ideia de coletividade das vítimas, inserindo ‘comunidades afetadas’ em todo o texto. Junto a isso, o país inclui a primazia dos direitos humanos, o princípio da centralidade do sofrimento da vítima e o direito à reparação integral. 

Uma das contribuições mais importantes ao nosso ver é a inserção das instituições financeiras, justificada pela necessidade de uma dimensão de direitos humanos ao conceder empréstimos e por seu envolvimento indireto em casos de violações, fala feita quando questionado por outros países. Apesar das contribuições conceituais quanto à linguagem, ainda não se vê proposições concretas quanto ao conteúdo no sentido de fortalecer os artigos sobre responsabilidade (Artigo 8) e jurisdição (Artigo 9), por exemplo.

Assim, aguardamos a publicação no site do Grupo de Trabalho (OEIGWG) dos relatórios e documentos oficiais, bem como a versão escrita das falas feitas pelos experts, para futura análise e aprofundamento. O Homa, então, irá trabalhar em um novo documento baseado nos pontos aqui mencionados para apresentar na 11ª sessão de negociação do instrumento vinculante, confirmada para outubro de 2025. 

Continue nos acompanhando nas redes para mais atualizações.

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